Mitologia Árabe

A mitologia árabe é um rico conjunto de crenças e narrativas que incluem jinn, seres sobrenaturais e criaturas fantásticas, refletindo a cultura e as tradições pré-islâmicas da Península Arábica.

Ifrit: os espíritos de fogo da mitologia árabe pré-islâmica.
Ifrit: os espíritos de fogo da mitologia árabe pré-islâmica.

 

Introdução: origem e aspectos gerais, aspectos gerais e funções


A mitologia árabe remonta à antiguidade pré-islâmica e reflete as crenças, ritos e narrativas dos povos árabes antes da consolidação do Islã no século VII. Assim como em outras civilizações antigas, os mitos árabes desempenhavam um papel fundamental na explicação dos fenômenos naturais, na legitimação das estruturas sociais e na conexão dos indivíduos com o divino.


Essa mitologia era fortemente influenciada pelo ambiente desértico da Península Arábica, pela vida nômade de muitas tribos e pelo sincretismo com outras culturas da região, como a mesopotâmica e a persa. Muitos dos deuses e espíritos reverenciados estavam associados à natureza, ao destino e à proteção dos clãs, demonstrando uma concepção do sagrado profundamente enraizada na realidade cotidiana desses povos.


Com a chegada do Islã, a antiga mitologia árabe foi gradualmente suprimida, sendo considerada superstição ou idolatria. No entanto, fragmentos desses mitos sobreviveram na literatura, na tradição oral e até em crenças populares que persistem até os dias de hoje. Além disso, algumas figuras mitológicas árabes foram reinterpretadas no contexto islâmico, tornando-se elementos do folclore e das lendas regionais.

 

Ilustração mostrando o peixe Bahamut carregando em suas costas o touro gigante (Kuyuta), e na laje de jacinto verde está um anjo com terra.

Bahamut: peixe gigante da mitologia árabe.




Características da Mitologia Árabe



• Forte ligação com a natureza e o deserto: a paisagem desértica da Arábia influenciou a formação dos mitos, dando origem a divindades e espíritos ligados às tempestades, aos oásis e às estrelas.


• Presença de divindades tribais: antes do monoteísmo islâmico, os árabes cultuavam diversas divindades locais, geralmente ligadas a um clã ou tribo específica, sendo reverenciadas por meio de rituais e oferendas.


• Jinns e seres sobrenaturais: os jinns, espíritos invisíveis que podiam ser benignos ou malévolos, desempenhavam um papel central nos mitos e na vida cotidiana. Acreditava-se que eles habitavam locais desabitados, como desertos e ruínas, podendo influenciar os seres humanos de diversas maneiras.


• Influências externas:
a mitologia árabe absorveu elementos de culturas vizinhas, como a mitologia mesopotâmica, a persa e a grega, criando uma rica interconexão de crenças e narrativas.


• Presença de divindades femininas: algumas deusas possuíam grande importância, como Al-Lat, Al-Uzza e Manat, que eram associadas à fertilidade, à guerra e ao destino.


• Mitos relacionados à Lua e às estrelas: os corpos celestes tinham um papel fundamental nas narrativas mitológicas árabes, sendo frequentemente associados a divindades ou a eventos cósmicos que influenciavam o destino humano.

 

Estátuas de 3 deusas da mitologia árabe pré-islâmica

Três deusas da mitologia árabe pré-islâmica: Al-Lat, Manat e al-Uzza com um leão que ruge.




Importantes figuras míticas árabes


A mitologia árabe conta com diversas figuras míticas, incluindo deuses, espíritos e criaturas sobrenaturais. Entre os mais importantes, podemos citar:


Hubal: considerado o principal deus dos coraixitas, tribo à qual pertencia Maomé, Hubal era adorado no templo da Caaba, em Meca. Representava a guerra e o destino, e sua estátua era consultada por meio de um oráculo.


Al-Lat: uma das três deusas principais da Arábia pré-islâmica, Al-Lat era associada à fertilidade, à terra e à proteção das tribos. Seu culto foi amplamente difundido na região de Taif.


Al-Uzza: deusa da força e do poder, frequentemente ligada à guerra e à proteção. Muitos guerreiros realizavam sacrifícios em sua honra antes das batalhas.


Manat: divindade do destino e da morte, Manat era reverenciada como aquela que determinava o tempo de vida dos homens e das tribos. Seu culto estava associado a rituais de passagem e ao luto.


Jinns: espíritos que podiam assumir diferentes formas e interagir com os seres humanos de forma benéfica ou malévola. A crença nos jinns persiste até hoje no mundo árabe e islâmico.


Bahamut: criatura colossal descrita como um peixe ou touro gigantesco que sustenta o mundo. Seu mito foi posteriormente incorporado em diversas narrativas do Oriente Médio e influenciou obras da cultura popular.

Ifrit: classe de entidades sobrenaturais da mitologia árabe, frequentemente descritos como espíritos poderosos de fogo. São considerados uma classe de jinn associada à vingança e ao caos, podendo ser benevolentes ou malévolos. Tradicionalmente, acredita-se que possuam grande força e habilidades mágicas, sendo difíceis de subjugar.

Roc: são aves gigantes da mitologia árabe, conhecidas por sua imensa força e capacidade de carregar elefantes em suas garras. Frequentemente mencionados em contos como os de Simbad, o Marujo, essas criaturas habitam ilhas remotas. Sua figura simboliza poder e mistério, sendo temidas por navegantes e exploradores.

 

Ilustração de uma água gigante carregando um elefante pequeno em suas garras.

Roc: ave gigante da mitologia árabe pré-islâmica.

 


Exemplos de lendas e mitos árabes:




O Mito de Bahamut: segundo a cosmologia árabe medieval, o mundo é sustentado por uma imensa criatura chamada Bahamut, que reside no oceano primordial. Ele sustenta um enorme touro, que por sua vez carrega uma rocha, sobre a qual repousa um anjo que segura a Terra. Esse mito demonstra a complexidade das antigas crenças árabes sobre a estrutura do universo e a relação entre os elementos cósmicos.


A Lenda dos Sete Dorminhocos: relato presente tanto na tradição árabe quanto em outras culturas do Oriente Médio, conta a história de um grupo de jovens que, perseguidos por um governante tirano por sua fé monoteísta, se refugiaram em uma caverna e adormeceram milagrosamente por séculos. Quando acordaram, descobriram que o mundo havia mudado completamente. Esse mito, posteriormente incorporado na tradição islâmica, representa a ideia da fé inabalável e da proteção divina.


O Espírito do Deserto: muitas histórias árabes falam sobre entidades misteriosas que habitam o deserto e testam os viajantes que cruzam suas terras áridas. Um desses mitos envolve um jinn disfarçado de homem que desafia os viajantes a responder a enigmas ou cumprir tarefas impossíveis. Aqueles que falham são condenados a vagar pelo deserto para sempre. Esse mito ilustra o temor e o respeito que os povos árabes tinham pelo ambiente hostil do deserto e pela imprevisibilidade das forças sobrenaturais.

A Rainha dos Ghouls: conta-se que no deserto árabe vive uma entidade demoníaca chamada Rainha dos Ghouls, uma criatura capaz de assumir a forma de uma bela mulher para atrair viajantes incautos. Segundo a lenda, aqueles que sucumbem ao seu encanto são devorados ao amanhecer. Esse mito servia como um alerta para os perigos do deserto e a necessidade de cautela com estranhos que surgiam em meio às dunas.

 

escultura de Aglibol, o deus da Lua da Mitologia Árabe

Aglibol, o deus da Lua da Mitologia Árabe

 

 


 

Por Jefferson Evandro Machado Ramos (graduado em História pela USP)

Publicado em 25/02/2025