Revolução Sandinista na Nicarágua

Ess movimento revolucionário, liderado pela Frente Sandinista de Libertação Nacional (FSLN), derrubou a ditadura de Anastasio Somoza, em 1979, instaurando um governo socialista que implementou reformas agrárias, educativas e sociais.

Anastasio Somoza: presidente da Nicarágua derrubado pela Revolução Sandinista.
Anastasio Somoza: presidente da Nicarágua derrubado pela Revolução Sandinista.

 

O que foi

 

A Revolução Sandinista, também conhecida como Revolução Nicaraguense, foi um movimento político e social que culminou na derrubada da ditadura Somoza pela Frente Sandinista de Libertação Nacional (FSLN) em julho de 1979. Esse evento marcou o fim de décadas de regime autoritário sob o controle da família Somoza e o início de um período de transformações políticas e sociais radicais no país. A revolução tinha como objetivo estabelecer um governo socialista na Nicarágua, abordando questões como pobreza, reforma agrária e a exploração estrangeira, especialmente o papel dos Estados Unidos no apoio ao regime Somoza. Essa revolução teve um impacto profundo no país e tornou-se um episódio significativo da política da Guerra Fria, à medida que o governo sandinista se alinhava com estados socialistas, sob liderança da União Soviética.



Contexto histórico


A Revolução Sandinista emergiu de um cenário histórico complexo, marcado por uma longa história de intervenção estrangeira, ditadura e desigualdade social. A Nicarágua, uma nação da América Central, estava sob influência dos Estados Unidos desde o início do século XX. Os EUA intervieram várias vezes, militar e economicamente, para proteger seus interesses, especialmente no que diz respeito ao acesso a recursos e ao controle sobre assuntos políticos na região.


Na década de 1930, os Estados Unidos ajudaram a instalar Anastasio Somoza García como presidente após o assassinato de Augusto César Sandino, um líder nacionalista que resistiu à intervenção americana. A família Somoza manteve o controle da Nicarágua por mais de quatro décadas, estabelecendo uma ditadura pessoal com o apoio dos EUA. O regime Somoza foi marcado por uma corrupção generalizada, abusos de direitos humanos e extrema desigualdade econômica. A economia nicaraguense beneficiava principalmente a elite, deixando a maior parte da população na pobreza. As condições de opressão e injustiça social, juntamente com o clima mais amplo da Guerra Fria, criaram o cenário para o surgimento de um movimento revolucionário.



Principais causas da Revolução Sandinista:


Desigualdade econômica: uma das principais causas da Revolução Sandinista foi a grave disparidade econômica entre a elite rica e a maioria pobre. A família Somoza, através de práticas clientelistas, monopolizou grandes partes da economia, particularmente a agricultura e a indústria. A concentração de terras nas mãos de poucos elites deixou a população rural sem terra e na miséria, alimentando o ressentimento entre camponeses e trabalhadores.


Corrupção e autoritarismo: a ditadura Somoza era notória por sua corrupção e abuso de poder. O governo, controlado pela família Somoza por mais de 40 anos, governava com mão de ferro, reprimindo a dissidência política e restringindo as liberdades civis. A família usava o estado para se enriquecer, inclusive apropriando-se de ajuda estrangeira, particularmente após o terremoto de Manágua em 1972, o que ressaltou ainda mais sua ganância e alienou a população.


Intervenção estrangeira, especialmente dos Estados Unidos: o governo dos EUA apoiou o regime Somoza por décadas, vendo-o como um baluarte contra o comunismo na América Central. Essa aliança com uma ditadura profundamente impopular fez com que muitos nicaraguenses associassem sua opressão ao imperialismo americano. A disposição de Somoza em agir como um cliente dos interesses dos EUA, especialmente durante a Guerra Fria, deslegitimou ainda mais seu governo, enquanto sentimentos antiamericanos alimentavam os ideais revolucionários.


Influência das ideologias marxistas e revolucionárias: durante as décadas de 1960 e 1970, movimentos revolucionários e ideologias marxistas se espalharam pela América Latina, inspirados pelo sucesso da Revolução Cubana em 1959. O movimento sandinista se inspirava tanto nos princípios marxistas quanto no legado de Augusto Sandino, que havia lutado contra a ocupação americana nas décadas de 1920 e 1930. A crescente popularidade dessas ideologias entre intelectuais, estudantes e trabalhadores nicaraguenses desempenhou um papel significativo na mobilização do apoio à revolução.

 

Bandeira vermelha na parte superior e preta na inferior. No meio, em branco, estão as letras FSLN

Bandeira da FSLN (Frente Sandinista de Libertação Nacional)

 



O processo revolucionário: como ocorreu e principais fatos


A Revolução Sandinista ocorreu ao longo de vários anos, culminando na derrubada do regime Somoza em 1979. A FSLN foi fundada em 1961 por um grupo de estudantes e ativistas inspirados nas ideias de Augusto Sandino. Inicialmente um pequeno grupo guerrilheiro, a FSLN realizou ataques esporádicos contra as forças militares de Somoza e tentou angariar apoio entre os camponeses.


Na década de 1970, a FSLN havia ganhado considerável força, ajudada pelo crescente descontentamento público com o regime Somoza, especialmente após a má gestão do terremoto de 1972 em Manágua. Quando o governo desviou ajuda internacional em benefício próprio, isso provocou uma indignação generalizada e fortaleceu a oposição a Somoza.


Em 1978, o assassinato do jornalista proeminente Pedro Joaquín Chamorro, crítico do regime, desencadeou grandes protestos e greves, levando a um amplo descontentamento civil. A FSLN, que havia se dividido em facções, se uniu para capitalizar essa crescente oposição. Apoiada por uma ampla coalizão de grupos sociais, incluindo estudantes, trabalhadores e a Igreja Católica, a FSLN lançou uma série de ofensivas militares em 1978 e 1979, levando a uma insurreição em grande escala.


O golpe final ocorreu em julho de 1979, quando Somoza, enfrentando a derrota militar, fugiu do país. Os sandinistas entraram em Manágua em 19 de julho de 1979, tomando o controle do governo. Isso marcou a vitória da Revolução Sandinista e o fim da dinastia Somoza.

 

Foto de guerrilheiros entrando na cidade de Léon durante a Revolução Sandinista

Guerrilheiros entrando na cidade de Leon durante a Revolução Sandinista (1979)




Principais consequências da Revolução Sandinista:


Transformação política e estabelecimento de um governo socialista: após a revolução, os sandinistas estabeleceram um governo revolucionário baseado em princípios marxistas. Eles implementaram reformas abrangentes, incluindo redistribuição de terras, nacionalização de indústrias e campanhas de alfabetização. O novo governo buscava transformar a sociedade nicaraguense, abordando questões de pobreza, desigualdade e dependência estrangeira.


Intervenção dos EUA e a Guerra Contra: apesar do apoio internacional inicial à revolução, as relações com os Estados Unidos rapidamente se deterioraram. Temendo a disseminação do comunismo na América Latina, o governo dos EUA, sob o presidente Ronald Reagan, começou a financiar e apoiar os rebeldes "Contras", um grupo contrarrevolucionário que se opunha ao governo sandinista. Isso levou a uma prolongada e brutal guerra civil que durou ao longo dos anos 1980, causando grandes danos econômicos e sociais à Nicarágua.


Reformas sociais e progresso na educação e saúde: um dos principais legados do governo sandinista foi seu foco em programas sociais. O governo lançou uma ambiciosa campanha de alfabetização que reduziu drasticamente as taxas de analfabetismo, além de investir em saúde e outros serviços sociais. Apesar das dificuldades econômicas causadas pela Guerra Contra, os sandinistas conseguiram realizar avanços significativos na melhoria da qualidade de vida de muitos nicaraguenses, especialmente os pobres rurais.


Conflito político duradouro e divisão: a Revolução Sandinista deixou um impacto duradouro na política nicaraguense. O país permaneceu profundamente polarizado, com apoiadores da FSLN e facções anti-sandinistas em conflito por décadas. Em 1990, os sandinistas foram derrotados em eleições democráticas, mas o partido continuou sendo uma força política importante na Nicarágua, com Daniel Ortega, uma figura chave na revolução, retornando ao poder em 2007 e permanecendo presidente, embora sua liderança tenha sido posteriormente acusada de autoritarismo.

 

 


 


Por Jefferson Evandro Machado Ramos (graduado em História pela Universidade de São Paulo - USP)

Artigo publicado em 27/09/2024

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