O Renascimento em Portugal

O Renascimento em Portugal foi um movimento cultural que floresceu entre os séculos XV e XVI, marcado pela valorização do humanismo, das artes e das ciências, influenciado pelas grandes navegações e pelo contato com outras culturas.

Renascimento Português: destacou-se nas áreas da literatura, pintura e arquitetura.
Renascimento Português: destacou-se nas áreas da literatura, pintura e arquitetura.



O que foi o Renascimento em Portugal


O Renascimento em Portugal foi um movimento cultural e artístico que, embora tenha seguido os moldes do Renascimento italiano e europeu, desenvolveu-se com especificidades próprias a partir do século XV, alcançando maior intensidade nos séculos XVI e XVII. Influenciado pelas mudanças que se verificavam em outros centros europeus, o Renascimento português coincidiu com o auge da expansão marítima e com o fortalecimento do Estado Moderno. Tratou-se de um período marcado pela valorização do conhecimento humano, da racionalidade, da arte clássica e da ciência, impulsionado, entre outros fatores, pelos contatos com o Oriente, pelas trocas culturais proporcionadas pelas grandes navegações e pelo florescimento da burguesia comercial.


Em Portugal, o Renascimento não se limitou à mera imitação dos modelos italianos ou flamengos. Desenvolveu uma feição própria, integrando elementos medievais com novas linguagens formais, inspiradas na Antiguidade greco-romana. Tal processo deu-se em meio a uma sociedade ainda fortemente católica e hierarquizada, o que fez com que as expressões renascentistas portuguesas oscilassem entre a valorização do humanismo e a manutenção de tradições religiosas e simbólicas do passado.



Características gerais do Renascimento em Portugal:



Valorização do Humanismo: o pensamento humanista influenciou diretamente a produção intelectual portuguesa, incentivando o estudo das línguas clássicas, o interesse pela história antiga, a filosofia moral e a pedagogia. Os humanistas portugueses defendiam a educação como meio de aperfeiçoamento moral e intelectual do indivíduo, buscando o equilíbrio entre fé e razão.


Influência das descobertas marítimas: o contexto da expansão ultramarina proporcionou um ambiente propício ao intercâmbio cultural e à valorização da experiência empírica. O contato com outras civilizações, a ampliação dos horizontes geográficos e a acumulação de riquezas fortaleceram as bases materiais para o florescimento do Renascimento em território português.


Diálogo entre o sagrado e o profano: embora fortemente católico, o Renascimento português incorporou temas mitológicos e pagãos à sua produção literária e artística. Havia um esforço em conciliar os valores cristãos com as referências clássicas da Antiguidade, o que resultou em obras que expressavam simultaneamente religiosidade e racionalidade.


Mecenato real: a corte portuguesa, especialmente sob os reinados de D. Manuel I e D. João III, desempenhou papel importante como promotora das artes e das letras. O mecenato real financiou artistas, arquitetos, escultores e escritores, além de importar obras, manuscritos e artistas estrangeiros que influenciaram diretamente a cultura local.


Estilo Manuelino: uma das contribuições mais originais do Renascimento em Portugal foi o surgimento do estilo manuelino na arquitetura, que fundia elementos góticos tardios com símbolos da expansão marítima, ornamentos naturalistas e motivos renascentistas. Este estilo é um dos mais reconhecidos legados visuais do período.




O Renascimento português na literatura


Na literatura, o Renascimento português manifestou-se por meio da adoção de novos temas, formas e estilos influenciados pelos ideais humanistas. A poesia lírica e épica ganharam destaque, com autores que retomaram os modelos clássicos de expressão, ao mesmo tempo em que exaltavam os feitos dos navegadores portugueses e os ideais de glória e virtude.


Luís de Camões é o nome mais emblemático da literatura renascentista portuguesa. Em sua obra, especialmente no poema épico "Os Lusíadas", observa-se a síntese entre o humanismo clássico, o cristianismo e o espírito expansionista da época. Camões empregou a mitologia greco-romana como recurso literário, ao mesmo tempo em que exaltava a história de Portugal e a fé cristã.


Outros escritores também se destacaram nesse período, como Sá de Miranda e Bernardim Ribeiro. Sá de Miranda introduziu em Portugal as formas poéticas italianas, como o soneto, a elegia e a écloga, além de temas filosóficos e morais. Bernardim Ribeiro, por sua vez, expressou sentimentos melancólicos e intimistas em sua obra, com destaque para a novela "Menina e Moça", considerada precursora do romance pastoril.

 

Pintura mostrando Camões lendo Os Lusíadas

Camões lendo Os Lusíadas a D. Sebastião (1893): litografia de Antônio Ramalho.





O Renascimento português na pintura e escultura


As artes plásticas portuguesas do Renascimento, embora marcadas por alguma permanência do estilo gótico, revelaram progressivamente maior influência italiana e flamenga, com ênfase no naturalismo, na perspectiva e na representação realista das figuras humanas. O desenvolvimento das técnicas de pintura a óleo e de escultura em pedra e madeira permitiu uma maior variedade de expressões visuais, tanto em obras sacras quanto profanas.


Na pintura, destaca-se o chamado "Renascimento português dos pintores", com nomes como Nuno Gonçalves, autor do célebre "Painel de São Vicente de Fora", que marca a transição do gótico para o renascimento. Embora anterior à plena difusão do Renascimento, sua obra já apresentava certo naturalismo e atenção à individualidade dos retratados, antecipando os valores humanistas.


Na escultura, o Renascimento português incorporou elementos decorativos e simbólicos com precisão técnica, especialmente nas fachadas de igrejas e mosteiros. Artistas como João de Ruão e Nicolau de Chanterene contribuíram para a difusão de formas clássicas, com destaque para a escultura em mármore e calcário, que passou a representar figuras com maior realismo anatômico e expressão emocional.

 

Pintura mostrando um religioso segurando a Bíblia e outros religiosos

Pintura que integra os "Painéis de São Vicente" (1470) de Nuno Gonçalves: exemplo da pintura renascentista portuguesa.

 



O Renascimento português na arquitetura


A arquitetura foi uma das áreas em que o Renascimento mais se fez sentir em Portugal. O estilo manuelino, surgido no final do século XV, é considerado uma das expressões mais características do Renascimento português. Desenvolvido durante o reinado de D. Manuel I, esse estilo combinava elementos decorativos góticos com influências marítimas e renascentistas, como colunas torsas, cordas esculpidas em pedra, esferas armilares e motivos vegetais.


Com o passar do tempo, a arquitetura portuguesa passou a adotar formas mais clássicas e simétricas, seguindo os modelos do Renascimento italiano. O claustro do Mosteiro dos Jerónimos e a fachada da Universidade de Coimbra refletem essa transição, apresentando maior racionalidade nas proporções, colunas inspiradas na ordem clássica e um sentido de harmonia estética.


A arquitetura renascentista portuguesa não se limitou às obras religiosas. Palácios, edifícios administrativos e universidades também foram influenciados pelos novos ideais construtivos. A utilização de materiais como o calcário e o mármore, além da crescente importância dada à ornamentação e à simbologia, conferiram sofisticação e solidez às obras do período.




Exemplos de obras do renascimento português:



Literatura "Os Lusíadas", de Luís de Camões: considerada a obra-prima da literatura portuguesa, esse poema épico exalta as conquistas marítimas do povo português, especialmente a viagem de Vasco da Gama à Índia. Inspirado nos modelos clássicos de Homero e Virgílio, Camões utiliza linguagem culta, métrica elaborada e referências à mitologia greco-romana para enaltecer a pátria e seus heróis. "Os Lusíadas" é, ao mesmo tempo, uma celebração da identidade nacional e uma síntese do espírito humanista renascentista.


Pintura "Painel de São Vicente de Fora", atribuído a Nuno Gonçalves: esta obra é um dos marcos da pintura portuguesa do século XV. Representa figuras da corte, cavaleiros, frades e o próprio povo em torno do mártir São Vicente, padroeiro de Lisboa. A composição destaca-se pela riqueza de detalhes, pela individualização dos personagens e pela tentativa de captar a complexidade humana em diferentes camadas sociais. Embora ainda carregue traços do gótico, antecipa o naturalismo e a centralidade do ser humano típicos do Renascimento.


Arquitetura Mosteiro dos Jerônimos, em Lisboa: construído no século XVI, o Mosteiro dos Jerónimos é uma das maiores expressões do estilo manuelino. Encomendado pelo rei D. Manuel I e financiado com recursos oriundos das riquezas das Índias, o mosteiro simboliza a grandeza do império ultramarino português. Sua arquitetura reúne colunas intricadas, arcos ogivais, motivos marítimos e elementos renascentistas, como a simetria e a ordem dos espaços. O claustro, em especial, é considerado uma obra-prima pela harmonia e refinamento das formas arquitetônicas.

 

Mosteiro dos Jerônimos em Portugal

Mosteiro dos Jerônimos: exemplo da arquitetura renascentista portuguesa.

 

 


 

Por Jefferson Evandro Machado Ramos (graduado em História pela USP)

Publicado em 15/04/2025