Cosmologia na Filosofia
A cosmologia na filosofia é o estudo racional e sistemático da origem, estrutura, ordem e finalidade do universo como um todo.

O que é Cosmologia
Cosmologia é o ramo da filosofia que se dedica ao estudo racional do universo em sua totalidade. Seu objetivo é compreender a origem, a estrutura, a ordem e a dinâmica do cosmos, a partir de princípios fundamentais que não dependem exclusivamente da observação empírica, mas que buscam coerência lógica e explicações de caráter metafísico.
Desde os primórdios da filosofia, a cosmologia esteve associada à tentativa de explicar não apenas os fenômenos naturais, mas também o lugar do ser humano no universo.
Embora hoje exista a cosmologia científica, baseada em dados da astrofísica, a cosmologia filosófica mantém sua relevância ao refletir sobre questões que transcendem os limites da ciência, como a existência do infinito, a finalidade do cosmos e a relação entre mundo e transcendência.
A Cosmologia na Filosofia Antiga
A origem da cosmologia filosófica remonta à Grécia Antiga, especialmente com os pensadores chamados pré-socráticos. Esses filósofos iniciaram uma ruptura com as explicações mitológicas sobre a origem do universo, propondo interpretações racionais que buscavam princípios universais e permanentes. Tales de Mileto, considerado o primeiro filósofo ocidental, sustentava que a água era o princípio fundamental (arché) de todas as coisas. Anaximandro, por sua vez, introduziu o conceito de ápeiron (o indefinido) como origem de tudo, defendendo que o cosmos resulta de uma dinâmica de separação de opostos. Anaxímenes acreditava que o ar era a substância primária que dava origem ao universo por meio de rarefação e condensação.
Outros filósofos pré-socráticos aprofundaram a reflexão cosmológica. Heráclito de Éfeso concebia o universo como um fluxo contínuo, onde tudo está em transformação, tendo o fogo como princípio unificador. Parmênides, em contraposição, afirmava que o ser é uno e imutável, negando a realidade do movimento e da multiplicidade. Empédocles propôs uma cosmologia baseada em quatro elementos (terra, água, ar e fogo), combinados por duas forças: amor e ódio. Já Anaxágoras introduziu o conceito de nous (mente ou inteligência ordenadora), como princípio organizador do universo. Por fim, Demócrito e Leucipo formularam a teoria atomista, segundo a qual tudo é composto por átomos em movimento no vazio, explicando o cosmos por leis mecânicas.
Platão e Aristóteles também desenvolveram cosmologias de grande influência. Platão, no "Timeu", concebe o universo como uma obra do Demiurgo, um artífice divino que organiza o caos segundo formas eternas. O cosmos é, para ele, uma entidade viva e dotada de alma. Aristóteles, por sua vez, propõe uma cosmologia geocêntrica, onde o universo é finito, esférico e ordenado em esferas concêntricas. O movimento é explicado pela existência do "motor imóvel", uma causa primeira eterna que move tudo sem ser movida.
|
A Cosmologia foi um tema muito importante para os filósofos antigos, principalmente entre os pré-socráticos da Grécia Antiga. |
Cosmologia na Filosofia medieval
Na Filosofia medieval, a cosmologia foi profundamente influenciada pela visão aristotélica, mas reinterpretada à luz da doutrina cristã. O universo passou a ser compreendido como criação divina, ordenado por uma inteligência suprema e providente. A cosmologia medieval conciliava a estrutura geocêntrica de Aristóteles com os relatos bíblicos da criação, promovendo uma visão hierárquica do cosmos, onde cada ser ocupa um lugar segundo sua dignidade ontológica e sua proximidade de Deus.
Santo Agostinho propôs uma cosmologia fundamentada na criação ex nihilo, ou seja, a criação do mundo a partir do nada, por vontade de Deus. Para ele, o tempo e o espaço são criaturas e não realidades eternas, sendo o tempo dependente da mente humana e da experiência de mudança. Santo Tomás de Aquino, influenciado por Aristóteles e pela tradição cristã, defendeu uma ordem cósmica racional, na qual as causas naturais operam segundo finalidades estabelecidas por Deus. Ele manteve a concepção de um universo hierarquizado, onde tudo se orienta para a realização do bem último.
A cosmologia medieval também foi marcada por debates sobre a eternidade do mundo. Enquanto Aristóteles afirmava que o mundo era eterno, os teólogos cristãos argumentavam que ele teve um começo. Diversos filósofos árabes e judeus medievais, como Avicena, Averróis e Maimônides, também se debruçaram sobre essas questões, tentando conciliar a filosofia grega com as escrituras sagradas de suas respectivas tradições.
Cosmologia na filosofia moderna e contemporânea
A filosofia moderna promoveu uma ruptura com a cosmologia clássica e medieval, especialmente a partir da revolução científica dos séculos XVI e XVII. A substituição do modelo geocêntrico pelo heliocentrismo de Copérnico, confirmado por Galileu Galilei e aperfeiçoado por Johannes Kepler e Isaac Newton, transformou profundamente a compreensão do cosmos. A ideia de um universo finito, ordenado hierarquicamente, foi substituída por uma concepção mecânica e infinita do mundo natural.
Descartes concebeu uma cosmologia baseada em leis mecânicas, em que o universo é uma imensa máquina regida por movimentos e colisões de partículas, excluindo causas finais. Espinosa identificou Deus com a própria substância do universo, afirmando que tudo que existe é uma manifestação do ser absoluto e necessário. Leibniz, por outro lado, propôs que o universo é composto por mônadas, unidades metafísicas que refletem o todo, agindo de forma harmônica por preestabelecimento divino.
No século XVIII, o Iluminismo acentuou o caráter racional e matemático da natureza, afastando-se da dimensão metafísica e teológica da cosmologia. Kant, no entanto, retomou a cosmologia filosófica em sua "Crítica da Razão Pura", refletindo sobre os limites da razão humana diante da ideia de um mundo infinito ou de um começo absoluto. Ele formulou as "antinomias da razão pura", demonstrando que a razão pode argumentar de forma válida tanto a favor quanto contra a infinitude do tempo e do espaço.
Na filosofia contemporânea, a cosmologia continua sendo tema de investigação, sobretudo no diálogo com a física teórica e a cosmologia científica. Filósofos como Alfred North Whitehead, Martin Heidegger e Karl Popper refletiram sobre a origem e o sentido do universo, embora a ênfase tenha se deslocado para problemas epistemológicos, linguísticos e ontológicos. O surgimento da teoria do Big Bang, da expansão do universo e da física quântica suscitou novas questões filosóficas sobre a origem do tempo, o papel do observador e a estrutura última da realidade. Mesmo sem oferecer respostas definitivas, a cosmologia filosófica segue interrogando o cosmos como totalidade significativa e como cenário do pensamento humano.
Por Jefferson Evandro Machado Ramos (graduado em História pela USP)
Publicado em 07/05/2025
Temas relacionados
Bibliografia e vídeos indicados:
GALLO, Sílvio. Filosofia: experiência do pensamento. São Paulo: Scipione, 2023.
Vídeo indicado no YouTube:
O que é Cosmologia? | Filosofia Descomplicada - Blog Nau dos Loucos